"Sou uma mulher madura que às vezes anda de balanço
Sou uma criança insegura que às vezes usa salto alto
Sou uma mulher que balança, sou uma criança que atura."

domingo, 9 de agosto de 2009

Confissões, contestações e cafonices

Ainda ontem me perguntaram como você conseguiu me conquistar e fazer o tal encanto durar por mais de uma semana. “Faz tanto tempo que eu já nem lembro mais”, eu disse numa tentativa de parecer indiferente ao assunto. Eu estava mentindo, é claro: eu ainda lembro o que você fez pra me deixar à beira do derretimento total, mas é que lembrar as suas conquistas e anunciá-las em voz alta é perigoso demais para alguém como eu, que vive tentando enterrá-las só para esquecer que desde então ninguém conseguiu ir tão longe como você foi.
A verdade é que tudo que você fez foi me conquistar nos detalhes e, principalmente, nas contestações. Sim, você me contrariou até o último segundo da nossa vida. Não que estejamos mortos, é óbvio, mas é que uma vida nossa, de fato, já não existe mais – e pode acrescentar essa contestação à sua lista, afinal eu não desejei que acabasse assim, tão prematuramente.
A questão é que você me contrariava com uma freqüência que beirava o sempre, a começar pelo futebol. Você falava mal do meu time – que ainda está na segundona graças às suas pragas – e torcia justamente para aquele que eu mais odiava. Ou talvez nem odiasse tanto assim. Quero dizer, o que eu odiava mesmo era não ser contrariada, o que, consequentemente, me levava a odiá-lo só para pegar o atalho mais rápido até as contestações, que podiam ser feitas por ambas as partes nesse caso.
Você também rebatia as minhas piadas sem graça. Arqueava a sobrancelha e as declarava como “infames”, embora eu pudesse ver o rasgo de boca que lutava para não virar um riso discreto, quase que abafado. E como eu poderia esquecer das suas piadas? Você vivia fazendo-as – e olhe que elas eram quase tão deploráveis quanto as minhas – e achando um jeito de me contrariar mais uma vez, novamente, de novo: apesar de eu não achar a mínima graça nelas, você sempre arranjava um jeito de me fazer rir no instante seguinte só para não sair por baixo (não que me fazer rir fosse difícil, de qualquer forma, o que tornava tudo aquilo ainda mais desonesto).
Você criticava igualmente os meus trocadilhos, coisa que mais ninguém se atrevia a fazer. Aí, quando eu arregaçava as mangas, montava a base e me preparava para brigar até te convencer do quanto eles eram formidáveis, você ia lá e elogiava a minha inteligência e o meu humor sagaz/levemente temperado com pimenta. Tudo pra me contrariar, é claro. E eu, sempre boba, mesmo sabendo que os elogios eram de mentirinha, deixava. Abaixava os braços e esquecia os golpes de boxes (mal) aprendidos no colégio e na academia.
Além disso, você me deixava a vontade para fazer charme, teatrinho e doce (inclusive o doce de verdade, que eu comia sem ouvir nenhuma palavra que passasse perto de “engordar”), o que eu adorava. Sempre amei colocar todo o meu drama em ação, disparar dez ou vinte hipérboles e puder ter a certeza de que as minhas brincadeiras de interpretar durante a infância tinham valido a pena. Apesar disso, amava ainda mais ter que admitir que você sabia interpretar e fazer ceninha ainda melhor do que eu – o que acontecia logo depois da minha performance, só para me contrariar.
Você reconhecia quando eu estava de TPM e, apesar do medo de ser ignorado ou receber meia dúzia de palavrões e patadas, enchia a minha paciência até o limite máximo antes da explosão. Já disse que era tudo só pra contrariar? Pois é, era. Cada palavra, cada “não, eu discordo”, cada aborrecimentozinho. Tudo só pra me contrariar.
Outra coisa que você sabia reconhecer eram aqueles momentos em que tudo o que eu queria era um abraço apertado. E aí você me abraçava forte, me fazia um denguinho, sussurrava Não vá embora ou I’ll love you ‘till the end no meu ouvido e terminava os mimos com um “adivinha?” (coisa que nunca fez tanto sentido para alguém como fazia para a gente). E aí, quando eu não tinha condições emocionais para responder algo à altura sem desabar em lágrimas, você ia lá e falava da sua ex ou da bonitona do comercial de cerveja. Nem sei porque eu me estressava, porque bem lá no fundo eu sabia que era só para me contrariar...
Você falava mal das minhas músicas sem conteúdo, das minhas festas lotadas e cheias de suor, das minhas gírias sem sentido – o que eu sempre achei um grande mole. Eu ainda acredito, entretanto, que elas lhe arrancavam umas risadas quando eu virava de costas. Risadas que você não assumia por um único motivo. Adivinha qual? Parabéns, você acertou.
Você também adorava me chamar de fria depois de uma ou outra briga sem fundamento (o que acontecia com uma freqüência enorme e nós adorávamos). Já te disse que depois de um tempo eu deixei de ligar? Pois é, deixei. Eu sabia que era só para me contrariar, até porque você buscava o meu calor na hora de fazer as pazes. E ninguém mistura calor e frio assim, com tamanha facilidade. Ninguém exceto eu.
Você dizia e se contradizia, declarava e contestava, brigava e pedia desculpas, mordia e assoprava. Você me contrariou a cada segundo que compartilhamos, querido. Nenhuma contestação, porém, chegou aos pés da última e derradeira:
― Não vá embora – eu disse.
― Eu tenho que ir – você respondeu.

Deve ser por isso, talvez, que você me conquistou. Deve ser por isso que até hoje eu lembro, e tento esquecer, e superar, e lembrar, e esquecer novamente. Mulheres são assim, afinal: contrariadas e incoerentes dos pés ao coração.
Ah, o coração...


Física? Química? Matemática? Quem liga pra isso, afinal? Tirei o dia para responder os comentários, haha. :P

terça-feira, 4 de agosto de 2009

A Primeira Vez - Parte 1

― É isso – o rapaz suspirou e mexeu os ombros displicentemente. – Não posso demorar, de qualquer forma. Ela está me esperando para seguirmos até o aeroporto – o tom desprovido de qualquer remorso e as suaves depressões ao lado do sorriso surgiram para terminar de matá-la.
O rosto da mulher, antes tão corado, perdeu o seu rosa característico. Talvez fosse culpa do vinho tinto do sangue que já não lhe corria pelas veias quase tão estreitas quanto a garganta entrelaçada e ressequida.
Ela tentou falar, mas a voz já não saía. Queria implorar para que ele ficasse ou ainda para usufruir de cada pedaço da culpa por ter sido tão cruel consigo mesma ao provocar a sua própria desgraça – egocêntrica até em um momento desses. Desgraça essa, porém, que nunca se igualou ao sofrimento, agora já enterrado pelo passado, dele. Ela queria pedir uma última e derradeira chance para rir cada riso e chorar cada choro daquele que seria para sempre a sua melhor companhia. Chorar cada riso dele? Minto. Por mais que os motivos para chorar sempre tenham sido colecionados por ele, era ela que sempre contava com a solidariedade do amigo para dividir as suas tristezas egoístas.
― Uhun – o grunhido sofrido foi tudo que saiu da sua boca seca. Os pedidos de fique mais e o gosto amargo do adeus: tudo engolido mesmo antes de ser posto para fora. Aborto, dor, morte prematura.
E o que fazer quando falta a voz, o som? Em casos extremos, entregue-se ao silêncio, ao abismo sem fim das palavras vomitadas no mute. Foi o que ela fez: tornou-se mais uma refém quase que pacífica e finalmente se rendeu às palavras.
As lágrimas, há muito congeladas pela frieza do coração, ameaçaram derreter. Em tempos vindouros ela teria culpado o aquecimento global; sabia, contudo, que o nome do fenômeno da vez era outro: perda. Sim, a perda de quem se ama e o ganho de uma tonelada de arrependimentos para saborear aos pouquinhos. Ganho e perda, perda e ganho. A antítese perfeita que, ao misturar o gosto da falta com o tato desesperado para apanhar o resto de cheiro que ainda pairava pelo ar espaçado do aposento, virou sinestesia pura. Pena que a sinestesia não anestesia os corações partidos...
Procurou forças para se levantar e seguiu. Precisava urgentemente de algo cortante. Algo capaz de fazê-la sangrar e, paradoxalmente, estancar a dor empedrada. Apanhou o lápis mais afiado e iniciou o ritual que adiara por tanto tempo. Com a força de quem já sofreu por amor, perfurou calmamente o papel e, pouco a pouco, as palavras jorraram o que estava entalado.

"Você sempre me disse que sua maior mágoa era eu nunca ter escrito um texto sobre você. Nem que fosse te xingando, te expondo. Qualquer coisa.
Você sempre foi o único homem que me amou. E eu nunca te escrevi nem uma frase num papelzinho amassado."


Primeira parte de uma história inspirada no texto A Primeira Vez, da Tati Bernardi. Se o resto ficar legal, eu continuo postando aqui. (:
Enfim, tinha prometido voltar a postar e, eu sei, acabei sumindo de novo. A questão é que a inspiração anda faltando ultimamente, bem como o tempo. Quem sabe agora ela vem me fazer uma visitinha? :P
Observações:
1) Gabi, voltei porque vi seu recado, haha.
2) Alva, juro que ainda posto o seu texto, tá? É a BRUXA, parça!
3) Responderei os comentários das duas últimas postagens assim que tiver uma oportunidadezinha, ok? (: